O que seu filho vai ser quando crescer?



O que seu filho vai ser quando crescer?

Sou mãe de um menino. Desde quando se está grávida, sempre rolam comentários sobre o sexo do bebê, até como uma forma de gracejo e afeto com a mãe e a criança. Comentários como “ih, menina? Vai ter seu cabelão” ou “menino é mais apegado a mãe, vocês vão ser um grude” são e sempre serão clássicos. Eu, como mãe de menino, até hoje ouço vários desse tipo. E, como não poderia deixar de ser, de outros tipos também. “Que menino bonito, vai pegar todas” ou “Esse aí vai comer geral” eram os comentários dos meus amigos – quase sempre, homens – em relação ao meu filho.
Eu sempre replicava: “E se fosse uma menina?”. As caras fechavam. Eles nunca deixariam a menininha deles sair por aí, pegando todos ou “dando pra geral”. Segundo eles, a menina só pode “casar depois dos 30”, vai ficar em casa e comportada. Tudo em tom de gracejo, claro. Mas em toda brincadeira, principalmente nessa, há um fundo de verdade.
Eu fui criada numa casa onde não havia, de certa forma, um machismo por completo. Minha mãe é a chefe da família: é ela quem administra o dinheiro, contas e até em que ordem as coisas ficam em nossa casa. E não porque meu pai é um “pau mandado”, mas sim porque ela é realmente a mais competente para tanto. Meu pai sempre a ajudou nas tarefas domésticas: ele cozinha, lava, passa, arruma, lava banheiro. E eu cresci vendo tudo isso acontecer e achando certíssimo.
Porém, alguns conceitos sempre ficaram intrínsecos. Para minha mãe, uma mulher não saber arrumar a casa é uma vergonha. Afinal, ela é mulher. Transar com vários homens? Coisa de piranha, mulher fácil que nenhum homem quer pra casar. Eu já tinha meus 18 anos e lembro perfeitamente de ela esconder as camisinhas que eu levava na bolsa, alegando que aquilo era coisa de mulher puta e andar com camisinha era assunto de homem. Minha sexualidade dizia respeito à ela enquanto eu morasse em sua casa. Ou seja: meu corpo não era tão meu assim.
Não quero me estender sobre como minha mãe era ou não feminista, mas tocar na ferida: e se eu fosse um homem? Será que eu seria criado da mesma forma?
A sociedade diz que eu tenho que aceitar meu filho trazer uma mulher diferente à cada noite pra dentro da minha casa. Mas minha filha? Só os namoradinhos sérios. Por causa dessa criação – não culpo a minha mãe, acho que ela me criou até abertamente demais para a criação que ela mesma teve – eu deixei de contá-la muitas intimidades minhas que eu queria ter dividido, muitas dúvidas que eu queria ter tirado. Por tabu. Por ser mulher e não poder ter a mesma liberdade sexual que eu teria, se fosse um menino. Deixei de ter momentos especialíssimos com minha mãe e com meu pai, como por exemplo contar da minha primeira vez, de como me senti, de como foi pra mim. De pedir a orientação deles pra isso.
Não é isso que eu quero pro Gael. Quero que ele sente abertamente comigo e conte sobre as dificuldades dele, e quero que quando eu tiver a minha menina, ela seja assim também. Sem tabus. Sem preconceitos. Com igualdade.
Aí então, volto ao título enigmático desse post: O que seu filho vai ser quando crescer? Como você quer criar seu filho para o mundo? Deixe de lado o fato de ele ser menino ou menina. Como você espera que ele se comporte com essas situações? Como você gostaria que ele respondesse todas essas perguntas, que eu estou fazendo agora? Se ele for menino, ele pode ter liberdades, e se for menina, ela não pode? Será que tem que ser assim?
Sim, eu sou mãe de um menino. E não aceito que me digam “graças a Deus, vai dar menos trabalho”. Vai me dar tanto ou mais trabalho, do que se ele fosse uma menina. Não vou criá-lo como um “pegador” ou “garanhão”, nem incentivá-lo a isso. Vou criá-lo para que ele  pegue quantas achar que deve pegar, independente do que a sociedade espera dele. Ou que não pegue. Que arrume a casa tanto quanto eu arrumo. Que divida as tarefas e que brinque de casinha. Que respeite uma menina pelo que ela é, e não por quantos parceiros ela tem ou não tem na cama. Que ele não a ache “dada” nem “galinha” só porque cedeu ao sexo no primeiro encontro. Mas principalmente, vou cria-lo para que ele seja  livre, de pensamento e de corpo. Para que faça suas próprias escolhas, tenha suas próprias ideologias e não seja mais um rótulo que a sociedade modela. Que ele não seja o “virjão” nem o “comedor”. Que ele só seja o Gael.
E você? O que seu filho vai ser quando crescer?

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